Autismo: relatos e desafios atípicos
“Eu não sabia o que era autismo, até ter o meu filho”. Esse é um relato muito comum entre mães e pais de crianças atípicas. Diferente do senso comum que acredita que a criança pode se tornar autista após certa idade, o Transtorno do Espectro é uma condição presente desde o nascimento. A grande questão é que o autismo só começa a ser percebido entre 1 e 2 anos de idade, pois é nesse período que as crianças começam a ter mais contato social e interagir com o meio.
Foi justamente nessa faixa etária que Michele Oliveira descobriu a condição do filho, Flávio, hoje com 6 anos. Assim como diversas mães, Michele aprendeu na prática o que é o autismo e como lidar com uma criança atípica.
“Ele nasceu prematuro, então até os dois anos de idade ele precisou fazer um acompanhamento. Pouco antes desse acompanhamento finalizar os especialistas começaram a perceber que ele esquecia as coisas que tinha aprendido, chegando ao ponto de esquecer até que eu era a mãe dele. Foi então que a pediatra realizou um encaminhamento para o neurologista infantil para iniciar a investigação. Devido às questões do nascimento dele havia a dúvida de que poderia se tratar de alguma má formação. Fizemos todos os exames solicitados e os resultados mostraram que estava tudo bem em relação a formação e crescimento dele. Com essa possibilidade descartada, os médicos continuaram a investigação até que chegaram ao diagnóstico de autismo.”, relata a mãe.
Receber um diagnóstico desconhecido é difícil. A falta de informação gera dúvidas e olhares preconceituosos. Michele diz que quando Flávio foi diagnosticado muitos familiares não aceitavam a condição do menino. “No começo eu guardava muito desses olhares e falas para mim. Hoje, eu não ligo mais para certos comentários. Faço a minha parte e tudo que posso para ver o meu filho bem.”, comenta.
O autismo é caracterizado pela dificuldade na comunicação, na interação social, comportamento repetitivos e estereotipados. Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), estima-se que o Brasil tenha cerca de 2 milhões de autistas, o que significa 1% da população. O número de pessoas no espectro é crescente em toda parte do mundo. Nos Estados Unidos, por exemplo, números revelam que a cada 30 crianças uma é autista.
Apesar do transtorno ser um só, cada autista é único e reage aos estímulos de forma diferente. Segundo a neuropediatra, Ana Gabriela Prado, médica da Apae Aracaju, algumas crianças com TEA podem apresentar alterações além das dificuldades de comunicação, por exemplo alterações sensoriais e seletividade alimentar. "Muitas pessoas acham, de forma errada, que essas características só podem ser percebidas na criança quando ela já está grande, mas na verdade já podemos avaliar desde pequenas. Temos que estar atentos aos sinais de alerta pois quanto mais cedo a gente começar a tratar as dificuldades de atraso daquele criança, maiores são as chances dela se desenvolver.”, explica a médica.
O TEA não tem cura, é um transtorno que deve ser tratado e acompanhado para que o autista tenha uma maior segurança e qualidade de vida. Por isso, o tratamento indicado é o multiprofissional, que envolve os profissionais de fonoterapia, psicologia, neurologia, terapia ocupacional e até fisioterapia.
A Apae Aracaju é uma das instituições que oferecem atendimento multidisciplinar para as crianças autistas do estado de Sergipe. Atualmente, 33 municípios fazem parte da cobertura da instituição. Com uma fila de espera expressiva, a Apae tenta expandir o convênio com a Prefeitura de Aracaju para que até junho deste ano mais 100 crianças autistas possam iniciar as terapias.
Mesmo com o tratamento profissional, a participação da família para o desenvolvimento da criança com TEA é fundamental. “É muito importante que a família acolha, que esteja preparada. As crianças autistas são crianças capazes de realizar qualquer atividade, desde que sejam estimuladas da forma correta. Por isso, devemos começar em casa a trabalhar o acolhimento e aceitação para que essas crianças se sintam confortáveis em desenvolver suas atividades.” explica a médica neurologista, Ana Gabriela Prado.
“Eu sei que o meu filho ainda tem muito a melhorar, e que ele vai conseguir seguir com o tratamento das terapias. Eu acredito muito nele e quero sempre o melhor. Mas a mudança não deve vim só dele, as pessoas também precisam mudar e enxergar com mais amor as potencialidades deles.”, conclui Michele.